quarta-feira, 23 de julho de 2008

A Doença como Possibilidade de Mudança


Atualmente contamos com uma incidência cada vez maior de doenças crônicas presentes em nossa sociedade. O câncer, por exemplo, é uma doença crônica que vem apresentando um crescimento assustador, principalmente por ser uma doença que pode afetar diferentes órgãos, ou seja, possui diversos tipos, e sua origem ainda não está bem estabelecido no âmbito médico.
Esta doença é conceituada como o conjunto de mais de cem doenças que têm em comum o crescimento desordenado de células que invadem os tecidos e órgãos, podendo espalhar-se para outras regiões do corpo.
Embora hoje, os avanços da medicina nos possibilitem vastos conhecimentos sobre sua formação, desenvolvimento e tratamentos disponíveis, nos deparamos com uma escassez de conhecimentos sobre os aspectos psíquicos envolvidos em tal vivência extremamente significativa na vida de cada sujeito que adquire tal enfermidade.
Desde a suspeita e concretização do diagnóstico de câncer, até a fase de exames e tratamento, a vivência de uma doença crônica como o câncer é sentida de uma maneira muito peculiar por estes pacientes. São fases carregadas de muita angústia e sofrimento, exigindo ajuda não só medicamentosa, mas no sentido de possibilitar a este sujeito novas possibilidades de vivenciar sua doença.
A visão fenomenológica não busca estimular um movimento de superação da questão da doença pelo sujeito, mas escutar e estimular, no doente, um esforço de compreensão e resolução de sua existência a partir da doença. Visa acolher a doença como algo que me diz respeito, não só porque ela me acometeu, mas porque fala de mim, para mim e, a partir disto, eu vou obter novamente uma oportunidade de me colocar em relação à minha pessoa.
A partir da fenomenologia, doença também pode ser considerada uma expressão de sanidade. Ela é a expressão não só do impedimento de eu continuar sendo, mas principalmente um impedimento de eu continuar sendo como sempre fui. Ela não é apenas uma ameaça, mas talvez seja um convite para o sujeito reconsiderar as direções que tenha tomado na vida atráves das práticas de elaboraçao de si. Isso possibilita ao sujeito voltar-se para a relação com sua própria vida e assim abrir-se para novas possibilidades de ser.
A doença passa a ser agente, se estabelece com a função de propor algo, uma possibilidade de um reflexão ética. Quando nos tornamos doentes, passa a haver um intercâmbio mais enriquecido entre as nossas possibilidades como ser humano e aquilo que realizamos na nossa vida.
É neste sentido que entendemos a doença como um reorganizador da vida, pois abre possibilidades de mudança. Este sujeito sai em busca de uma nova morada ética, ou seja, visa atribiuir um novo sentido para sua vida.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Saúde, Ética e Bioética


A sociedade atual a qual nos encontramos, passou a possuir uma característica estrutural de desterritorialização. O sujeito perdeu seu referencial e a proteção familiar, pois esta instituição entrou em crise. Este sujeito por sua vez, procura se refugiar em si mesmo, buscando algo que o tire desse contexto de abandono. Esse narcisismo é resultado de uma cisão acentuada do sujeito com a sociedade, ficando a cargo do próprio sujeito a responsabilidade pelo seu fracasso ou sucesso.

Com essas mudanças de concepção ética dos homens, os profissionais da saúde tentam se adaptar as demandas que surgem neste contexto. Acabam se deparando com situações onde o sujeito deve enfrentar certas questões, como a morte, a miséria, a somatização, dentro outras, porém sem uma estrutura que o possibilite tal enfrentamento e lhe dê bons resultados.

O sujeito contemporâneo se depara com um sentimento de desamparo, de não pertencimento ao mundo em que vive. Quando ele nasce, ele é arremessado ao mundo, porém amparado e acolhido pela sua família. Esta lhe dará condições para que ele viva novas experiências no mundo, sabendo que tem a sua disposição, um refúgio que o aguarda, caso estas experiências sejam muito dolorosas ou insuportáveis.

Este é o papel da Ética; dar suporte ao indivíduo, ou seja, permitir que através da sua subjetivação, ele consiga vivenciar e experimentar, reconhecendo-se como sujeito, e sentindo-se pertencente ao mundo em que vive. A partir disto, o sujeito passa a ter a possibilidade de lidar com as coisas, ou seja, cria possibilidades de enfrentamento e passa a ter saúde.

Segundo Aristóteles, saúde significa estar em equilíbrio. Este equilíbrio deve ser regido pela razão, que passa a controlar os desejos e paixões daquele indivíduo. Atualmente concebemos o termo saúde não como a ausência da doença, mas como um estado em que o sujeito possui recursos e tem possibilidades de lidar com as situações que se apresentam para si.

As doenças crônicas, como o câncer por exemplo, caracterizam os quadros opostos de saúde, em que o sujeito não tem possibilidade de retornar ao estado de equilíbrio anterior de forma espontânea. O que ocorre, então, é o que podemos chamar de uma fratura ética.

No caso de doenças crônicas, essa fratura ocorre não por falhas nas situações constitutivas no início da vida do sujeito, mas por fenômenos que ocorrem no percurso de sua vida, decorrentes de situações específicas de exclusão e de desenraizamento ético. Estas falhas rompem com a possibilidade do ser humano habitar eticamente o mundo, e assim retornar ao seu estado natural de equilíbrio e harmonia.


A Bioética e suas implicações no exercício da Psicologia


O campo da Bioética busca estabelecer ponte entre as ciências e a humanidade, uma construção entre pessoas, profissionais da saúde e demais áreas que atuem direta ou indiretamente com o humano. É um conjunto de conceitos, argumentos e normas que valorizam e justificam eticamente os atos humanos que podem ter efeitos irreversíveis sobre fenômenos vitais.
Desta forma, a Bioética busca parâmetros para que os profissionais da área de saúde enfrentem questões delicadas, como por exemplo questões sobre a vida e a morte.

Pensando no exercício da Psicologia, podemos exemplificar questões bioéticas presentes neste âmbito principalmente relacionadas ao sigilo. Se uma senhora, em atendimento psicoterápico revela que está com uma doença crônica, já em fase avançada, porém devido ao medo do preconceito resolve não contar para a família, além de não buscar tratamento médico, cabe ao psicólogo se aliar a paciente neste segredo, ou comunicar a família para que esta a ajude?

Diante destas questões, devemos pensar a Bioética como um campo de grande importância, e que nos possibilita refletir sobre cada dilema enfrentado e suas particularidades. Para a Bioética não existem verdades, mas a preocupação de que todo o ser humano tenha direito de receber o melhor tratamento disponível.